quarta-feira, fevereiro 28, 2007

Pactos e escolhas

Trovões, raios, a chuva batendo na janela, lá fora uma escuridão total, assim como dentro do meu coração, na sala uma luz fraca, lágrimas escorrendo pelo rosto, um bolo se formando na garganta, impedindo de respirar, de falar ou engolir, nos ouvidos apenas as palavras: “Ela se foi”. A raiva crescendo, o medo, a angústia, tudo apertando meu peito, desespero – Preciso sair daqui, isso não pode ser verdade. – a chave nas mãos, a porta batendo atrás de mim, meus passos ecoando pela escada, a chuva encharcando minhas roupas, o sorriso dela na minha memória, nossos dias felizes passando a minha frente, um bar, uma dose de bebida, duas, três, dez, ela ainda sorri, a chuva piora, um beco escuro, uma voz baixa, rouca, um homem de cabelos vermelhos, diz que pode me ajudar, apagar a dor, trazer os bons momentos, uma troca, barganha, um dia eu lhe retribuo, a solidão, o vazio, o sorriso dela, seus beijos, eu murmuro um sim, caminho de volta, luz acesa na janela, abro a porta, ela sorri, me abraça, um sonho talvez, não é real, o perfume doce dela, o gosto da sua boca, alguém diz milagre, eu não ligo, estou feliz, ao fundo um reflexo no vidro, um riso cínico.

Meses depois, a vida é boa, estamos juntos, mais apaixonados que antes, pelo espelho do banheiro a vejo deitada dormindo, abaixo os olhos, não é meu reflexo, cabelos vermelhos, chegou a hora ele diz, meu preço é alma dela, não, de forma alguma, tem de haver outro jeito, eu não vou deixar, trato é trato, você não pode, eu vou impedir, ele pensa, diz que aceita uma outra forma de pagamento, eu vou trabalhar pra ele, caçar fugitivos , pra isso ele vai me dar o poder necessário, serei imortal, terei força sobre-humana, terei que deixa-la, pra sempre, nunca mais poderei trocar uma palavra, uma carícia, um beijo, um olhar, desrespeitar a regra implicará na volta do pacto original, peço tempo, 5 minutos é tudo que obtenho, ele ri, some, um cheiro horrível por toda parte.

Ela está de pé na cozinha, é linda, usa uma camiseta minha, branca, oferece um copo de suco digo que não, falo que vou embora, pergunta porquê, minto, digo que não a amo, que nunca amei, que tenho outras, que ela não passava mais uma diversão, uma tonta, ela não acredita, despejo um caminhão de palavras duras, baixas, ataco sua auto-estima, seu amor, tudo, nada pode restar inteiro, ela tem que me odiar, fraquejo, penso em contar a verdade, não posso, é proibido, pego uma mochila, encho de roupas, abro a porta, barulho de choro, algo quebra na cozinha, algo se parte dentro de mim, bato a porta, não olho pra trás, sumo do bairro, da cidade, durante meses escuto lágrimas e de fundo um riso malicioso, até que um dia tudo cessa, apenas o grito dos que caço permanece inalterado.
Continua em breve...

4 comentários:

  1. cara, isso me lembrou demais d'O Motoqueiro Fantasma...

    e ficou muito legal! quero ver logo a continuação!

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  2. Nossa........ Arrepiei toda!!!! =O

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  3. Dark querido, muuuito obrigada pelos seus comentarios. Por todos eles. Comecei o blog super insegura, com uns textinhos bobos e vcs gostaram!!! Fiquei mais animada!
    To com uma saudade danada do povo aí viu? Mas acho q nos vemos em breve!
    Bjo

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  4. Agora, comentando o texto:
    Maravilhoso, da uma sensação estranha qd vai lendo, uma angustia, depois comoção... incrível!

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