quarta-feira, maio 16, 2012

O retorno de Zebrinha do Céu - Inédito

O celular desperta tocando AC/DC, "Shoot to Trill" pra ser mais específico, mais um dia se inicia na atribulada vida de Zebrinha do Céu, nosso velho amigo calça seus chinelos sem vontade alguma, o frio o empurra de volta pra cama, mas corajosamente Zebrinha continua sua caminhada ao banheiro, afinal foram 15 dias de bode na cama, chega, está na hora de sair de casa, retomar a vida normal, voltar as aulas, ao trabalho, ou seja ao convívio social.

Ele para em frente ao espelho, fica olhando aquele rosto e tem dificuldades pra se reconhecer na imagem refletida, ainda está bêbado de sono, escova os dentes com sofreguidão, lava o rosto, mãos apoiadas na pia, cabelos desgrenhados e molhados, olhando para o nada, parece que se passaram só alguns  segundos, mas não, dormira de pé e com os olhos abertos, um estalo passou por sua mente, um pequeno choque naquele torpor que se instalava, olha o relógio 08:45, estava atrasado, aliás muito atrasado, termina de se vestir rapidamente, um copo d'água gelado é seu café da manhã e parte para a faculdade.

Poucos passos depois do portão de sua casa, lembra que esqueceu o celular na cama e pior vai precisar dele, volta, pega o celular, sai de novo, cada vez mais atrasado, um pouco mais a frente sente que tem algo errado no seu peso, algo falta, para, pensa, bate as mãos no bolso, cadê as chaves?

 - Meu Deus, esqueci no lado de fora da porta!

Volta correndo, atabalhoado, nada na porta, aliás o portão estava trancado, nada de chaves na fechadura:

- Caralho, alguém pegou a chave e agora? Ligo pra policia? Pro chaveiro? Que merda, como posso ser tão esquecido.

Abre a mochila, quase chorando de raiva de si próprio, para pegar o celular e ligar pra um chaveiro, enquanto procura o aparelho, uma barulho de metal, um leve tilintar, tira os livros, o fichário, embaixo de tudo o maldito molho de chaves, começa rir, um riso nervoso, mas também de alívio, só que agora estava mais atrasado, recolhe tudo e recomeça a correr para o ponto de ônibus.

Quase no ponto Zebrinha do Céu vê o seu ônibus partindo, não, ele pensa, agora teria que esperar uns 15 ou 20 minutos pelo próximo, resignado continua a caminhar e ao chegar encosta-se no muro para esperar a próxima condução. Resolve colocar os fones - Melhor esperar escutando música. - raciocina, rock é o som, ele acompanha a música batendo o pé levemente  no chão, como que marcando o ritmo, percebe que duas moças olham pra ele, uma fala pra outra, risos baixos, apontam em sua direção, o rapaz começa a achar que está arrasando, ambas são bonitas, ele se aproxima delas, retira um dos fones:

- Bom dia.

- Bom dia. - elas respondem, rindo baixinho.

- Eu percebi que vocês não paravam de me olhar e sorrir, como sou meio distraído pensei "será que nós nos conhecemos e eu não lembro delas"? É isso?

- Não - responde a moça da direita - mas você ser distraído explica porque olhávamos na sua direção e ríamos.

- É mesmo? 

- É, - disse a da esquerda - apesar de já termos visto pessoas com tênis de cores diferentes é a primeira vez que vemos alguém com um pé azul de cano baixo e um vermelho de cano alto. Hahahaha. Desculpa, não deu pra segurar.

Só então Zebrinha reparou, que na pressa de se trocar, calçou um pé de cada par de tênis, ficou vermelho de vergonha, as moças subiram no ônibus delas sem se despedir e ainda rindo, o que ele poderia fazer agora, voltar pra casa estava fora de cogitação, acabaria mais atrasado, o negócio era engolir a vergonha e ir pra faculdade assim mesmo, após alguns minutos embarcou a caminho da aula.

Faltando poucas quadras para o ponto onde deveria descer começa a desabar o maior temporal já visto e nosso herói sem guarda-chuva, nada pra se proteger, não podia acreditar, era muito azar, desembarcou no local e ainda faltavam uns duzentos metros para a faculdade, correu, não havia tempo, passava das 10:00hs já, chegou ensopado, até suas cuecas estavam molhadas, cruzou a catraca, voou pelas escadas até o segundo andar, entro na sala 215 e nada, estava vazia, nenhuma alma viva.

- Não acredito, será que mudamos de sala, ou a aula acabou mais cedo?

Desceu, foi até a secretaria, só tinha uma mulher lá pendurada no telefone, falando sobre receitas de bolo, nem lhe deu atenção, impaciente o rapaz procurou um dos seguranças da portaria:

- Oi, você sabe me dizer se o 2º ano de fisioterapia mudou de sala ou se estão no laboratório, não tinha ninguém lá na 215.

- Não moço, ninguém mudou de sala, não. E posso lhe garantir que ninguém está no laboratório também.

- Ué, mas cadê todo mundo então?

- Olha, eu diria que devem estar em suas casas dormindo, afinal, hoje é sábado, não tem aula.

- Sábado? Hoje é sábado?

- É. - respondeu o guarda, segurando o riso. Zebrinha do Céu olhava pra ele com uma cara de incrédulo, sábado, era sábado, toda a correria, a chuva, o cansaço por nada. Encarou bem o segurança e disse:

- Puta que pariu, sabia que devia ter ficado na cama. Aaaatchimmm!!!

Voltou para casa, molhado, cansado e além de tudo resfriado, é talvez fosse melhor ter ficado na cama mesmo.

Fim.



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