quarta-feira, outubro 29, 2014

Plano B (Conto de Halloween)


Tarde da noite, em uma rua escura qualquer, de uma cidade grande qualquer:

- Oi!

- Oi, você veio!?

- Você sabe que eu sempre venho quando me chama.

- É, obrigada.

- Não tem o que agradecer, entra no carro, te levo pra casa e você me conta direito o que houve.

- Ok. - ela entra no carro, o cumprimenta com um beijo na bochecha, os lábios dela estão gelados por causa do frio.

- Faz quanto tempo que você está aí parada no frio?

- Umas 3 horas, eu acho.

- Por quê não me ligou antes pô?

- Eu achei que ele ia voltar. - Sua voz sai trêmula, talvez pelo frio, talvez pela tristeza ou pela raiva de ter que ficar no frio e no escuro numa rua deserta.

- O que aconteceu dessa vez?

- O de sempre...

- Ciúmes.

- É, ciúmes.

- Você não aprende mesmo.

- Não fiz nada, ele surtou porque achou que eu estava dando mole pra um cara, eu só tava dançando, nem tinha visto o sujeito.

- Não tinha visto, sei.

- Tá, tinha visto, mas não fiz nada demais, só percebi que ele me olhava.]

- Hã-ram e aí?

- Bem e aí que o Artur viu o cara me olhando e surtou, disse que ia embora e ia me largar lá. Eu fui atrás dele, disse que não tinha nada demais ali, que ele tava criando caso a toa, e saímos de lá discutindo.

- E o que mais, onde ele tá?

- Não sei, entramos no carro, ele continuava brigando, dizendo que eu não respeitava ele, que ele era sério, que o namoro era sério, sei lá de onde ele tirou que era namoro..., que não era palhaço e nem ia ser feito de trouxa por uma sem vergonha e vagabunda feito eu, aí quando ele me chamou disso sentei a mão na cara dele.

Um riso engasgado. - Desculpa, continua.

- Aí fudeu, ele ficou puto, parou o carro e me mandou descer. Disse que não ia descer, ele deu a volta no carro, me puxou pra fora e me jogou na calçada, disse que ali era lugar de piranha que fica flertando com tudo que é homem, taquei o sapato nele só que errei, droga estraguei o salto, ele entrou no carro e saiu.

- Filho da puta! E mesmo assim você achou que ele ia voltar.

- Achei.

- Tsc, tsc.

- Ah meu, eu só arranjo B.O., nem tava fazendo nada de errado dessa vez.

- Dessa vez, né. rsrsrs

- É, rs, mas também não sei de onde ele tirou que é namoro.

- Quanto tempo vocês tão saindo?

- Uns 2 ou 3 meses mais ou menos.

- Sempre?

- A gente se vê quase todo fim de semana.

- É namoro.

- Não é, não quero namorar, não quero nada sério.

- Pra ele é namoro, pra maioria das pessoas se ver quase todo fim de semana por mais de 2 meses é namoro, pra um sujeito ciumento então é compromisso eterno.

- Ai, não.

- Ai, sim.

- Que merda, porque sempre comigo isso?

- Porque você é especial, já te disse isso. Você é linda, independente, inteligente, boa companhia, tem essa carinha de "por favor tomem conta de mim" e esses olhar que derrete o cérebro da gente.

- Ah tá, tenho tudo isso, só que não né.

- Você nunca me leva a sério, tô falando sério, não esquenta com isso, você ainda vai encontrar alguém pra te fazer feliz.(Ou já encontrou e não percebeu.)

- Ah, não, desisto, vou ficar sozinha que é melhor, menos complicação, não sirvo pra essa história de relacionamento.

-...

Depois de 40 minutos o percurso termina:

- Chegamos!

- Obrigada, só você pra me tirar dessas encrencas, olha a hora quase 4 da manhã, tô abusando.

- Sem problema, você pode, sabe disso. Não consigo te dizer não.

Um sorriso, outro beijo na bochecha, uma despedida:

- Se cuida, precisando de algo liga.

- Pode deixar, vai com cuidado.

- Ok.

10 minutos depois:

- Você sabe que é o Plano b dela, né?

- Sei.


"...I'm not in loveSo don't forget it
It's just a silly phase I'm going through..."

- Sabe que ela só te mantêm por perto pra não correr o risco de ficar sozinha.

- Eu sei.

- Hahaha, viado, ela sabe que você é louco por ela e vai te manter por perto como um cachorrinho.

- Você tá muito folgado, pra quem tá amarrado e até 5 minutos atrás tava chorando amordaçado no meu porta malas.

- É pode ser, mas mesmo assim você sabe que vai ser sempre o Plano B dela, você nunca vai ser o A, nunca vai ser o principal, nunca o namorado, pra sempre o bom amigo, você sabe né seu corno?

- É e daí?

- Como e daí, você não tem orgulho, amor próprio?

"...Ooh, you'll wait a long time for meOoh, you'll wait a long time..."

- Tenho, mas isso não tem nada com a história.

- Claro que tem.

- Não tem, você precisa entender uma coisa, o que aconteceu e o que vai acontecer não tem relação comigo, eu só quero que ela seja feliz, não me importo em ser o Plano B, ou C, ou Z, eu vivo dentro de uma nuvem escura a maior parte do tempo, mas quando ela está perto é como se eu vivesse na luz, o sorriso dela ilumina minha escuridão e quando tipos como você a magoam, a machucam o sorriso vai embora, a luz vai embora, pra mim não tem problema, me acostumei as trevas, mas não vou deixar ninguém leva-la pra lá, seja por capricho, por egoísmo ou orgulho besta.

- Você não pode fazer isso comigo, as pessoas vão descobrir, vão atrás de você.

- E porque iriam? Nunca te vi até hoje, aliás eu nem saberia quem você era se não tivesse partido pra cima de mim quando me viu saindo da casa dela, nem foto sua vi.

- Seu maluco, filho da puta e o que você tinha ido fazer lá?

- Fui levar uma flor pra mãe dela, é aniversário dela, você não sabia? e ainda diz que tava namorando, tsc, tsc. Pro seu azar ela me ligou, tava chorando e brava, disse que você tinha largado ela no meio do nada, pediu pra ir buscá-la, você partiu pra cima de mim bem na hora que desliguei.

- Maldito, tinha visto foto sua no Face com ela, pra mim vocês tinha algo e ela dizia: - "Não, o Gabriel é só um amigo, nada a ver." Mas eu sabia, sabia que tinha algo, aí te vejo saindo da casa dela, bem logo depois de eu ter brigado e largado ela por aí, tive certeza que você já tinha a pegado e estavam de sacanagem na casa.

"...I'm not in loveSo don't forget it..."

- Engano seu, aliás por quê você estava lá, não largou ela lá no meio do nada?

- Fui até lá ver se ela tinha aparecido, ia me fazer de arrependido, mas queria descobrir se ela tinha voltado, como e com quem.

- Hum, entendi, deu azar.

O carro sai da estrada, entra numa trilha fechada, árvores altas, apenas o farol do carro iluminando parcamente o caminho.

- O-o-onde estamos?

- Na parada final.

- Hã?

"...(Be quiet...big boys don't cry...)..."

- Na sua parada final.

- Não, não por favor, não!

- Sim, sinto muito.

- Nãooo, chuinf.

- Não se preocupe, não vai doer, muito.

- Por favor, não, eu me desculpo, eu sumo, não.

- Meio tarde e você não é de confiança.

- Por favor, não, espere me responda, por que essa música em looping o caminho todo e aqui também?

- Sabe aquela expressão: "Uma mentira contada muitas vezes se torna verdade."? Estou tentando me convencer que é verdade.

O brilho dos faróis refletem no instrumento em sua mão, a lâmina desce rapidamente, um jorro vermelho e quente inunda o solo, um corpo cai sem vida, um pensamento se repetindo: "Apenas o Plano B, bem e qual problema nisso.", ao longe um uivo e pela mata apenas a canção:


"...I'm not in love
So don't forget it

It's just a silly phase. I'm going through

And just because I call you up
Don't get me wrong
Don't think you've got it made
I'm not in love
No, no..."

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